01/09/2025
Para gerar impacto, organizações precisam investir em inclusão efetiva, desenvolvimento de carreira e liderança comprometida
Nos últimos anos, falar em diversidade deixou de ser apenas uma tendência e se tornou uma exigência de mercado. Mas contratar pessoas de grupos historicamente sub-representados não basta: sem oportunidades reais de desenvolvimento, o que acontece muitas vezes é apenas diversidade simbólica — ou, como chamam especialistas, "inclusão perversa".
Um post recente da especialista em diversidade e inclusão Natália Bovolenta no LinkedIn questionava justamente isso: até que ponto a presença é confundida com pertencimento dentro das empresas?
O tema não é apenas ético, mas estratégico. Estudos mostram que equipes diversas impactam diretamente nos resultados das empresas. Segundo estudo da McKinsey em 2023, organizações com mais diversidade étnica e de gênero em seus conselhos têm 27% mais chance de apresentar desempenho financeiro superior. A Korn Ferry aponta que essas empresas têm 76% mais probabilidade de gerar ideias inovadoras e receitas de inovação 19% maiores.
No Brasil, a pesquisa da Associação Brasileira de Comunicação Empresarial (Aberje) realizada em 2019, com 124 empresas aponta que os principais motivos para investir na pluralidade de talentos são melhorar a reputação (68%), contribuir para mudanças estruturais na sociedade (63%) e desenvolver soluções inovadoras (47%).
Quando a inclusão é apenas simbólica
Segundo Pablo Café Gomes, analista de Diversidade, Equidade e Inclusão, a inclusão perversa ocorre quando a diversidade é apenas figurativa: “As empresas contratam pessoas de grupos sub-representados, mas não criam oportunidades reais de crescimento. Muitas vezes, esses profissionais são usados como um ‘token’, apenas para mostrar ao mercado uma falsa diversidade”.
Exemplos não faltam: pessoas negras concentradas em cargos iniciais, pessoas com deficiência contratadas apenas para cumprir cotas e mulheres em posições de gestão sem acesso aos mesmos recursos que os colegas homens.
Entre marketing e compromisso real
A diferença entre diversidade simbólica e de fato pode ser sentida no dia a dia. “Algumas empresas exibem números e campanhas incríveis, mas as pessoas diversas não avançam na carreira, não ocupam liderança e não têm espaço para se desenvolver”, explica o analista.
Para Gabriel Leví, fundador e consultor de diversidade na Mutünci, a armadilha é clara quando lideranças e RH não entendem o valor da diversidade para o negócio. “Sem perceber que ela impulsiona inovação, atrai talentos e fortalece a competitividade, a inclusão tende a se limitar ao cumprimento de cotas ou à boa vontade individual de algumas pessoas”, diz.
Identificando sinais de alerta
Observar processos seletivos é um bom ponto de partida. Leví cita como alerta a ausência de candidatos diversos em regiões com alta representatividade ou a eliminação desproporcional de determinados grupos em etapas específicas.
No plano de carreira, o problema se repete: “Pessoas diversas podem ser contratadas, mas não avançam no mesmo ritmo que os demais ou ficam concentradas em áreas com baixa chance de crescimento”, acrescenta.
Caminhos para inclusão efetiva
Planejamento e intencionalidade são essenciais. Leví recomenda que o RH antecipe quais áreas e perfis serão demandados e crie trilhas de crescimento para grupos minorizados. Gomes reforça que práticas simples de gestão fazem diferença: feedbacks justos, reconhecimento de conquistas, planos de carreira estruturados e tolerância zero a comentários discriminatórios.
A liderança também é determinante. “Quando uma pessoa diversa entra na empresa, sua principal referência é a liderança imediata. É ela que pode abrir ou fechar portas, estimular ou desmotivar. Sem líderes engajados, a inclusão dificilmente se sustenta”, afirma ele. Leví complementa: “Processos podem ser ajustados e a cultura evoluir, mas sem liderança comprometida, nada se mantém ao longo do tempo”.
Medindo pertencimento
Além de números de contratação, é fundamental avaliar pertencimento. Na Mutünci, o fundador explica que são utilizados indicadores como segurança psicológica, integração de diferenças e percepção de tratamento justo, além de entrevistas qualitativas. “Essa abordagem mostra pontos fortes e áreas que precisam melhorar em termos de inclusão e pertencimento”, diz.
Leví alerta: “Quando a inclusão é simbólica, a pessoa percebe que não foi escolhida por competência, mas apenas para preencher um número. Isso mina a motivação e aumenta a rotatividade”.
Fonte: Pequenas Empresas & Grandes Negócios